segunda-feira, 26 de julho de 2010

Naturalmente Selvagem


Não consigo acreditar na premissa de que todo ser humano tem que; se não transcender, pelo menos manter em controle seu lado “animal”. Não sei ao certo o que as pessoas normais pensam que esse lado bestial dentro de cada um de nós quer dizer, mas tenho absoluta certeza que não pode ter o significado ou valor que dou a essa estranha e encantadora parte do meu ser.
Sempre percebi uma espécie de borbulhante força quente e irrequieta pulsando dentro do peito e durante muito tempo fiz tudo que pude para mantê-la aprisionada e distante de todas as possíveis soluções racionais que precisei tomar. Não foi agradável ou fácil fingir que não estava lá, me empurrando para dentro de meu próprio corpo, exigindo ser ouvida e respeitada, nem tampouco tentar racionalizar a sensação asfixiante e desconfortável que sempre surgia após fazer o certo e esperado socialmente em detrimento do aperto consistentemente presente em meu coração. Tinha medo das conseqüências dos meus simples instintos. Agir impulsivamente só poderia trazer resultados catastróficos. Não é assim que somos ensinados desde pequenos? Seja racional... Pense... Evite sofrimentos desnecessários!
Bem, isso pode ser verdade e funcionar para certas pessoas. No meu caso, se mostrou perda de tempo e vida. Fazer o que é certo porque alguém disse isso não é uma escolha e não gera nada de criativo. E ainda abre espaço para nutrirmos a idéia que alguém sabe mais do que nós e que temos uma parte interna que não presta, cria problemas e destrói. Ficamos com tanto medo de sermos integrais, de sermos naturalmente espontâneos que passamos a agir de forma doente e insegura. O que não só faz o outro, qualquer outro, se transformar uma ameaça constante como também nos obriga a permanecer eternamente em estado de alerta.
Viver sob essa nuvem de proteção e desconfiança é cruel em muitos aspectos. Até porque nos priva de tudo que considero realmente divino nos seres humanos.
Verdade, simplicidade, entrega, comunhão, cumplicidade, amizade, força, capacidade de resposta e adaptação, lealdade, confiança, honra e tantas outras, não acontecem através de nossos pensamentos. Todas essas qualidades nascem apenas quando somos inteiros, quando somos capazes de enfrentar qualquer momento em totalidade, sem pensar no que é politicamente correto, sem pesar ganhos ou perdas, apenas respondendo honestamente ao desafio inerente do momento presente.
A vida acontece aqui e agora. A vida acontece sob nosso nariz enquanto nos perdemos nas armadilhas mentais que questionam o melhor caminho. Exaustivo e contraproducente.
Precisei passar por muitos dissabores para entender que não privilegiar minhas motivações intelectuais abre espaço para que muitos mistérios se desdobrem e que confiar na minha essência selvagem desperta sentidos que vão além dos conceitos limitantes da lógica. E estranhamente me fortalece porque me capacita a dar espaço e ser receptiva as incontáveis formas que a vida tem de trazer surpresas. É nessa vibração instintiva, naturalmente despida, que o dom do encantamento encontra o suporte para florescer. Certamente, nos dá a sensação de tombo eminente, de andar na corda bamba, de joelhos trêmulos e borboletas no estomago. Mas, não é assim que nos sentimos em todos os momentos que consideramos especiais em nossas vidas? Do primeiro beijo, até o momento brutal de despedida, o que encontraremos em comum nos eventos marcantes de nossa existência é a ausência do raciocínio controlado. Somos tocados quando não nos protegemos. Somos inteiros quando absorvemos a verdade crua, não elaborada ou fantasiada. Somos naturais quando algo nos joga de volta ao centro e exige uma resposta imediata e genuína. E é nesse ponto que podemos entender a importância de sermos capazes de dar as boas vindas ao que se mantém superior aos nossos mais elaborados sonhos.
Naturalmente selvagem é o que busco ser cada vez mais. Flexível, confiante e alerta. Humildemente consciente da grandiosidade do universo e eternamente perplexa com o potencial humano. Á vontade com meus desejos, disponível para cheiros e sabores diversos, confortavelmente conectada com minhas deficiências, respeitando interações de espaço, uivando separações, saboreio encontros e desobedeço as normas. Já não lido com sensações de aperto e celebro cada precioso momento de liberdade da minha parte animal. Meu mundo é maior e melhor. Assustador e repleto de desafios por certo. Mas, com gosto de quero mais!

Nenhum comentário: