
Quando conhecemos alguém que desperta nosso coração, deixamos uma nova coloração entrar em nossas vidas. E tudo que parecia fruto de uma rotina cinza, passa a ter novo brilho, novos matizes, novos tons. Daí me percebo diante de duas questões: 1) Será o amor realmente dependente de outra pessoa? E 2) Uma vez conhecido o amor, somos incapazes de mantê-lo vivo independentemente do outro?
Penso que as crianças agem por amor, mas de forma inconsciente. Para elas é natural ver tudo como divino, especial, milagroso e harmônico. A princípio, abertos como nascem, se movem curiosamente, encantados e preenchidos por todas as coisas ao seu redor. Das magníficas às mais comuns, tudo é novidade e alegria. Até quando deixa de ser. O medo, então, é descoberto, junto à dor e a decepção e a vida veste a roupa apertada da defesa e da proteção. O bom e o mau se tornam conhecidos, assim como a recompensa e o castigo, a aceitação e a rejeição e a necessidade de sobreviver.
Creio que o amor é produto da consciência da não separação, da sensação de pertencer, da intuição que somos essenciais ao fluxo da vida. Talvez, por isso, estejamos sempre na espera do outro. Quando me sinto amada, afrouxo as amarras do medo e da solidão e recordo a sensação uterina de segurança, paz, e conexão harmônica.
Estranho esse ser humano... Pois, encontra no outro sua prisão e sua liberdade.
Quando crianças aprendemos limites, comportamentos, posturas morais etc. Somos podados, castrados, diminuídos, esculpidos em resposta a sabe-se lá o que. E crescemos na esperança do encontro com alguém que nos faça fortes e audaciosos para fazer o caminho de volta ao que é real, natural e verdadeiro para nós mesmos.
Abrimos mão do que somos para nos sentirmos amados e lutamos para encontrar o amor que nos dará a força para recuperarmos o que éramos ou deveríamos ser. Parece-me que se fossemos capazes de acordar o amor dentro de nós conscientemente e independentemente de qualquer coisa ou pessoa, descobriríamos o caminho para nossa realização pessoal e genuína liberdade. Será isso possível? Desejado? O que seria viver amando sem motivos? O que mudaria em nossa vida cotidiana?
Mantendo as crianças como referência, acredito que voltaríamos a ter a capacidade de rir profundamente, sentir honestamente, saborear sabores variados, chorar sem medo do ridículo, abraçar com o coração aberto, ver sem julgamentos, falar sem preconceitos e acima de tudo, confiar na vida. Com uma diferença apenas; faríamos tudo isso com consciência, gratidão, orgulho, dignidade e com o respeito mais profundo que só brota da semente do amor. Já imaginou o impacto que seria viver num mundo onde pessoas naturalmente, sem esforços ou imposições, simplesmente amam?
Difícil até imaginar...principalmente porque o amor nasce da aceitação, do deslumbramento, da arte de simplesmente viver. Quem entre nós honestamente acorda exultante pelo simples fato de estar vivo? Quem entre nós ainda se lembra da borbulhante alegria de ver alguém que se vê todos os dias? Quem entre nós manteve acesso os sentidos necessários para se maravilhar com a rotina?
Buscamos o outro para encontrar amor, porque nos permitimos desistir de nós mesmos. Esquecemos o milagre da vida, nossa unicidade e as razões que nos fazem continuar caminhando dia após dia. Corremos contra o tempo acelerado e perdemos a noção do que nos alimenta e faz crescer. E nos enganamos com a expectativa de recuperar nossa essência através do outro. Desejamos que o outro cure nossas feridas, limpe nossas bagunças emocionais, liberte nossas almas e nos guie em segurança à nossa realização plena. Pobre do outro! Ele que se encontra igualmente perdido e sedento, não pode dar o que não tem. Fracassamos aos pares e culpamos o que estiver mais à mão.
Resumindo; na minha experiência de vida, o amor só se mostra nos momentos em que volto para dentro e olho com coragem o que preciso, quero e desejo. O amor pulsa na minha vida, quando me permito ser o que sou, mantendo portas e janelas abertas num convite à vida e as pessoas. Todas as vezes que fui agraciada por momentos de profundo amor, estava comprometida com minha verdade, atenta aos anseios de minha alma e entregue aos ventos ondulantes das possibilidades com total confiança e fé. E nessa abertura despojada, nessa aceitação humilde, nesse relaxamento vibrante, descobri que o amor não vem a quem exige, ordena, pede. O amor acolhe, protege e envolve quando nos respeitamos, nos mostramos e nos arriscamos a nos revelar ao outro, sem cobranças ou expectativas de permanência. Momentos raros! Momentos eternos! Liberdade frágil, preenchimento tênue e uma transformação que deixa marcas profundas. Acima de tudo, compreensão de que só se vive amor verdadeiro, quando se é capaz de amar a si próprio.
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